Elson Aráujo
Nunca foi fácil cumprir
regras, contudo, elas se tornaram necessárias a partir do surgimento dos
primeiros agrupamentos humanos, ou seja, as aldeias, tribos,
clãs, que deram origem às nações de hoje. Dessa necessidade de se
organizar, e por vezes pacificar a convivência humana, surgiram os códigos
estudados atualmente nos livros de História tais como Hamurabi, a
Lei das XII Tábuas e os códigos de Manu e Draco, só para citar os
mais conhecidos, e dos quais se herdaram muitos dos fundamentos contidos nas
legislações penais mundo afora.
Assim como o homem sempre
teve dificuldade de seguir regras, as mesmas sociedades, que por
intermédio de seus legisladores, as ditaram, sempre tiveram dificuldade de
fazer com que estas fossem cumpridas.
Na Bíblia Sagrada, no
Livro de Exôdo, no Antigo Testamento, está escrito que o próprio Deus
ditou a Moisés os Dez Mandamentos que se fossem cumpridos tornariam a
sociedade humana mais harmoniosa, mas, não é isso que se constata em dias
hodiernos. O que se percebe é que nem Deus com essas dez regras do “bom viver”
conseguiu deter alguns comportamentos humanos reprováveis aos Seus olhos.
Digamos que se pelo menos
50% do que ditou o Pai Celestial a Moisés fossem praticados por
nosotros , não tenho dúvida nenhuma, de que as relações humanas não
estariam hoje assim, tão conturbadas.
Interessante observar que
alguns dos “bens” contidos nos Dez Mandamentos são protegidos pelo Divino, e a
sentença por esse tipo de infração, segundo os ensinamentos cristãos, é
a “ ida para o inferno”. Outros, pelo Divino e pelas leis vigentes, o que
pode originar ai dupla sentença: uma espiritual e outra humana.
O que dizer do Sexto
Mandamento- não matarás- que foi tipificado, no caso do Brasil, a partir
do artigo 121 do Código Penal ? E do Oitavo- não furtar, também
positivado no nosso Código Penal no artigo 155 ? Bastaria o cumprimento
desses dois dispositivos pra coisa começar a melhorar no mundo, o que sabe ser
uma utopia cada vez mais sedimentada. Um sonho distante de vir a ser cumprido,
mas não de ser sonhado.
Vida e patrimônio, bens
protegidos pela Lei de Deus e pela Lei dos homens desrespeitadas todos os dias
no mundo inteiro.
É esse o grande problema,
por exemplo, do Estado Brasileiro: detentor de uma overdose de leis, mas
que, no “frigir dos ovos”, não são cumpridas nem respeitadas,
justamente pelo fato desse Estado não oferecer as condições necessárias
para que tais dispositivos sejam integralmente cumpridos.
Portanto, de pouco adianta
criar novas leis, emendar a Constituição, mudar o regramento já existente, como
querem agora com a redução da maioridade penal, se antecipadamente já se sabe
que não vai adiantar nada, sendo mais um “show para agradar a
plateia” e proporcionar uma falsa sensação de que a partir dessa mudança a
violência vai diminuir no País. Aposto com qualquer um se essa mudança trará
mais segurança para a sociedade.
Ao partir para o
encerramento da coluna desta semana ainda uma breve consideração sobre
esse assunto da redução da maioridade penal, tema que há anos domina o
debate nacional, principalmente quando ocorre algum fato típico de extrema
gravidade praticada por adolescentes: há de se ressaltar que, embora a mídia
insista em privilegiar apenas um lado da questão, é bom que se diga que
existem duas correntes que digladiam atualmente: uma contra a
redução e outra favor, com argumentos fortes de ambos os lados. No meu caso,
filio-me ao posicionamento e argumentos da Conferência Nacional dos
Bispos do Brasil-CNBB- contidos num lúcido documento
publicado 1999, mas muito atual, uma vez que nada mudou desde então.
Assinado à época pelo
padre Plínio Possobon, um trecho do mencionado documento assinala que:
“Não é justo pretender
reduzir a idade da responsabilidade penal sem antes cobrar a implementação das
medidas previstas pelo Estatuto da Criança e do Adolescente. Os especialistas
consideram que a recuperação do cidadão em desenvolvimento não pode se dar
através do sistema penal, considerado arcaico e falido pelo Judiciário, mas sim
através das medidas socioeducativas previstas pela legislação atual. (CNBB,
1999, p.2)
Já me atrevi a escrever
sobre esse assunto numa coluna anterior. De fato, com a falência visível
do sistema penal/ prisional brasileiro e sem nenhuma solução, pelo menos
aparente para essa problemática, a redução da menor idade penal só
agravará mais ainda a situação, com o aumento da população carcerária
brasileira que, de acordo com o Conselho Nacional de Justiça –CNJ, já
é a terceira do mundo com 715.655 presos. O Brasil perde somente
para os Estados Unidos, que abrigam 2.228.424 presos, e para a China com
1.701.344 presos.
Possuímos um sistema
prisional, como é notório, que além de não ressoacializar ninguém,
encontra-se atualmente sob o domínio do crime organizado.
Diante do exposto é fácil
concluir, portanto, que encher as prisões de adolescentes infratores, sem a
menor sombra de dúvida, não reduzirá a violência. E como não temos prisão
perpétua, no modelo vigente, a redução da maioridade penal no
Brasil só produzirá uma nova casta de criminosos, jovem e
mais feroz . Um verdadeiro tiro no pé.
Quem viver, verá.