FSP: O DEM ficou com o comando de Câmara e Senado, mesmo não
tendo as maiores bancadas. O que significa isso para o partido?
RM: O DEM já tinha a presidência da Câmara, então ficou mais
fácil de organizar essa eleição. No Senado, é mais fácil de falar, o que
aconteceu é que um sentimento de que não era o melhor momento para o Renan
[Calheiros (MDB-AL)] somado a erros de alguns candidatos que tinham potencial
em tese maior que o Davi [Alcolumbre (DEM-AP)], acabaram concentrando os
votos nele. O Davi construiu isso com apoio do governo e com as próprias
energias, porque de fato o DEM não podia trabalhar para duas candidaturas.
FSP: O DEM à frente das duas Casas impõe um ritmo do partido
independente do governo ou faz a sigla ser um alicerce do Planalto?
RM: Não somos linha auxiliar do governo nem do partido do
governo. O grande desafio do DEM vai ser a capacidade de compreender que a
construção da presidência de um partido que não é o majoritário é sempre
coletiva. Você não é o presidente que vai defender os interesses do DEM, tem
que defender a agenda de todos os partidos. É um momento de mudança, um
quadro pulverizado, e ninguém consegue ter a hegemonia que o MDB teve no
passado no Senado.
FSP: Com a derrota, o sr. acha que o Renan Calheiros atuará para
atrapalhar a votação da reforma da Previdência?
RM: Eu não acredito que um político com a experiência e história
do Renan vá fazer algum movimento no curto prazo que sinalize uma revanche,
não acho que é do estilo dele... Mas o governo vai ter que saber construir
pontes com ele.
FSP: O sr. defendeu o voto secreto nas eleições do Senado. Acha
que o fato de os senadores terem aberto o voto cria precedente perigoso?
RM: A gente tem que tomar muito cuidado, porque o voto secreto é
a garantia do eleitor. O voto secreto não defende o conchavo, como muitos
acham.
FSP: O ministro da Casa Civil, Onyx Lorenzoni (DEM-RS), articulou
contra o sr., mas a favor do Davi. O governo venceu ou perdeu na eleição do
Congresso?
RM: Eu acho que o Onyx tinha uma outra formatação, eu de fato não
apoiei o Bolsonaro e acho que no primeiro momento o governo queria a
construção de um nome que tivesse apoiado. Era legítimo isso, mas o governo
não interveio como poderia porque senão tinha viabilizado a candidatura do
João Campos [PRB-GO], do Alceu [Moreira (MDB-RS)] ou do Capitão Augusto
[PR-SP].
FSP: Não interveio porque não quis ou por inabilidade da articulação
do Onyx?
RM: O Bolsonaro não quis dar os instrumentos [a ele] para isso.
Quando o Bolsonaro pega um ministério e entrega a chave para o ministro
nomear os auxiliares, ele tira as condições de construir uma maioria no
formato antigo.
FSP: Mas dado que o chefe da Casa Civil atuou contra o sr., como
fica a relação com o Planalto?
RM: Não tem problema nenhum a relação com o Planalto, nem com o
Onyx nem com ninguém.
FSP: O sr. não tem boa relação com o Onyx.
RM: Tive a vida inteira. Tive um conflito que eu nem considero
conflito nas [votação das] 10 Medidas [Contra a Corrupção, em 2016], em que o
relatório dele acabou sendo derrotado, não por um comando meu para
derrotá-lo, porque eu não tinha 310 votos. Fora isso, sempre tive relação
boa, sempre foi meu amigo.
FSP: Mas quem será o seu canal de diálogo?
RM: Quem escolhe o canal de dialogo é o presidente da República,
não eu.
FSP: É possível votar a reforma da Previdência nas duas Casas até
julho, como o governo quer?
RM: É, até julho é. Assim, tem que construir [a maioria]... eu
não conheço ainda o ambiente do plenário.
FSP: O sr. fala em construção coletiva para o texto da reforma.
Onyx diz que já está pronto. Vai haver muita mudança da proposta original
para a que chegar ao plenário?
RM: Isso é matemática, não deve ter muita equação diferente do
que os governadores estão pensando. Mas, se você não incluí-los nesse debate,
vai ter mais dificuldade para aprovar. Eles estão vivendo o mesmo drama que o
governo federal, até pior.
FSP: O governo pensava na possibilidade de fazer uma emenda e
colocar o texto para votação direto no plenário. Como o sr. enxerga isso?
RM: Eu acho que uma PEC ser apensada sem passar pela CCJ
[Comissão de Constituição e Justiça] me parece próximo do impossível. Depois,
ou a gente vai construir coisa pactuada com governadores ou não será uma
votação fácil, ter os 308 votos. Estamos em um momento que todos
compreenderam que vai ter uma ruptura definitiva da política se esse país não
voltar a crescer. Então não dá para errar o tiro da Previdência.
FSP: O sr. foi eleito com apoio de parte da esquerda —PDT e PC do
B. Como vai tratar a agenda conservadora de costumes do governo?
RM: Depois que superarmos a agenda econômica, vamos discutir o
que fazer com essa agenda de costumes. Tem deputados que foram eleitos para
essa agenda de costumes [conservadora], como alguns deputados de esquerda
também foram eleitos para uma agenda mais liberal nos costumes, mas acho que
a Câmara não deve ser um ambiente de radicalismo, a gente tem que tentar ter
uma pauta que construa com equilíbrio as agendas prioritárias do Brasil e eu
enxergo, a curto prazo, que a agenda prioritária é a reforma do Estado.
FSP: O sr. vai barrar o projeto da Escola sem Partido?
RM: Quem vai barrar é o STF [Supremo Tribunal Federal], não eu.
Quem é a favor da Escola sem Partido tem que tomar cuidado porque, na hora
que começar a tramitar no Congresso, o Supremo vai derrubar, vai declarar a
inconstitucionalidade.
FSP: O sr. vai evitar que essas votações polêmicas cheguem ao
plenário?
RM: Não sou contra que a Câmara faça debate. Uma coisa é o debate
em comissão, outra é plenário. Não sei se jogar esses temas dentro do
plenário ajuda um país que precisa, com urgência, ser reformado. Você acaba
gerando relações de atrito entre base e oposição que vai dificultar votar as
matérias econômicas no plenário. Você não pode ficar gerando um ambiente de
campo de guerra no plenário porque precisa de um ambiente mais distensionado
para que tenha as condições de trazer governadores do Nordeste, de oposição,
para ajudar nesse diálogo [das pautas econômicas]. Se ficar estressando o
plenário antes da Previdência, o ambiente para votá-la vai ser muito
precário.
FSP: O sr. acha que polarização da política e sociedade que vimos
na eleição continua ainda hoje?
RM: Hoje, antes de o Congresso começar a trabalhar, está mais
calmo. Mas a gente não sabe como será o plenário.
FSP: Técnicos da Câmara dizem que os deputados novos da base
devem usar mais tempo de fala do que as anteriores, o que poderia atrasar as
votações.
RM: É como se fosse um jogo de futebol, né? Se o Flamengo vai
jogar contra o meu time, eu vou jogar também. Alguns como são pessoas que vêm
desses movimentos de redes sociais e precisam estar lá sempre vão ter o
embate com a Maria do Rosário [PT-RS], com a [Erika] Kokay [PT-DF], ou o Jean
Wyllys [PSOL-RJ] —que agora saiu.
FSP: Como o sr. viu a renúncia do deputado Jean Wyllys?
RM: Momento ruim da política, né? O Jean Wyllys representava uma
parte da sociedade que precisa de voz no Parlamento. E a partir do momento
que ele considera que o Estado não tem condição de garantir a preservação da
vida dele e da família, eu acho que é uma sinalização perigosa para a
democracia brasileira.
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