Na semana passada a poetisa Lília Diniz, que é servidora da Fundação Cultural de Imperatriz (FCI) concedeu entrevista ao site do Curso de Jornalismo da UFMA causando grande repercursão no meio cultural. A entrevista em que ela analisa o trabalho da FCI foi reproduzida por diversos blogs. Alguns blogueiros e leitores viram a fala de Lília como um ataque á estrutura da Fundação.
Em contato com o blog Lília Diniz disse que não esperava tamanha repercursão e que de algum modo suas palavras foram mal interpretadas.
Sobre o assunto ela concedeu a seguinte entrevista:
Pergunta- Em recente entrevista ao site do curso de Jornalismo da Ufma você, além de falar de sua vida, de sua produção artística, fez referencias a atual gestão da Fundação Cultural. Referências estas que receberam críticas de alguns leitores. O que você tem a dizer sobre o assunto?
Primeiro quero aproveitar para pedir desculpas, de público, aos colegas de trabalho, e se fui mal interpretada é pela incapacidade que ainda tenho de me expressar.
Depois quero dizer que, como ser crítico que sou, não posso perder a minha capacidade de análise só porque estou participando do governo, da fundação cultural de Imperatriz, e quero fazê-las com respeito e responsabilidade a cada um que faz parte desta equipe.
Entretanto, algumas pessoas precisam aprender ler melhor e saber interpretar de modo coerente o que lêem, e não ficarem procurando meios de comprometer, e de maliciosamente, usarem o que outras escrevem para fazerem jogo desonesto.
Eu disse a seguinte frase: a Fundação Cultural ainda não acertou o passo para uma gestão que dê conta, de fato, das demandas da cidade. Isso não é exclusividade de nossa cidade. Poucos órgãos gestores conseguiram sair da situação viciada, do modo equivocado de lidar com a produção cultural. Observe que ao citar o ainda, eu não estou condenando a Fundação Cultural, nem falando de incompetência ou coisa parecida. Vou citar o seguinte exemplo, uma pessoa que nunca dançou forró, quando for tentar a primeira vez certamente vai ter algumas dificuldades, vai pisar no pé do seu par, mas com persistência, treinando e acreditando que ela é capaz, vai conseguir dançar bem. Acredito que assim tem sido assim na Fundação.
Existe uma preocupação do Presidente da Fundação Cultural, Antonio Lucena, em fazer uma gestão transparente, que posso alcançar os mais diversos seguimentos artísticos, reflexo disso é que a produção de eventos tem funcionado muito bem. A equipe tem se esforçado e tem feito com competência tudo o que se propôs a fazer. As parcerias buscadas pelos coordenadores, que tem desempenhado um competente papel de produtores, têm dado certo e o resultado é a satisfação da cidade.
Ao ler a matéria do professor Marcos Fábio (UFMA) quando ele fala “O desafio agora, dos gestores municipais, é encorpar cada vez mais a ‘cesta básica’ de cultura e arte de que o imperatrizense necessita para viver melhor”, penso que é esse desafio vai além da produção de eventos, que precisamos dar conta. Que passa por entender a cultura como vetor de desenvolvimento social e econômico, garantindo a consolidação de políticas públicas que vá de encontro às necessidades reais dos artistas, produtores culturais e outros segmentos que fazem a dinâmica da cultura acontecer.
Pergunta- Você fala na entrevista que é preciso avançar além do campo da produção de eventos. Poderia falar mais sobre o assunto?
Claro. Quero ainda citar o professo Marcos Fábio (UFMA), quando ele diz na entrevista que “fica agora o desafio de buscar, de maneira sistemática, novas oportunidades para outras formas de expressão”. Esse desafio e essa sistemática passa pela elaboração de Leis que garantam uma governança e uma governabilidade de sucesso. Eu estou no governo e torço pra que ele dê certo e tenho dado algumas contribuições. Posso citar um dos nossos encaminhamentos que foi a proposta de Lei que cria o Sistema Municipal de Cultura. O Sistema de Cultura hoje é exigência do Ministério da Cultura para qualquer município que queira receber recursos advindos do Fundo Nacional de Cultura e, além disso, que queira fazer convênios na área da cultura.
Pergunta- Você pode citar exemplos de Leis em outros estados?
Em alguns municípios existem leis que criam os salões de Artes Plásticas, uma lei destas garante que eventos como o concurso de artes plásticas que a FCI realizou agora, com muito sucesso, possa sobreviver às mudanças de governo. Aqui em Imperatriz temos a Lei que criou o Prêmio Literário, que é coordenado pela Academia de Letras e que, aliás, precisa ser discutida a forma como ele se dá, afinal não temos escritores somente na Academia de Letras. São formas sistemáticas de se pensar em continuidade de projetos que valorizam e fomentam a cultura local. Outro exemplo é Lei de Proteção ao Patrimônio Imaterial que existe no Ceará, Pernambuco, Bahia e em alguns outros estados brasileiros, esta lei ampara e mantém em salvaguarda mestres da cultura popular que deram sua contribuição cultural para o estado e que muitas vezes passam por condições de vulnerabilidade social. Então o estado não apenas divulga, mas protege seus saberes tão importantes para a identidade do povo brasileiro e faz ainda o entrelaçamento destes saberes com a escola, por exemplo.
A cultura tem uma cadeia produtiva variada e o órgão gestor de cultura precisa pensar em suas várias etapas, infelizmente aqui no Brasil ainda estamos engatinhando nesta questão. Em Imperatriz não poderia ser diferente, e com o agravante que historicamente ficamos à margem das poucas políticas públicas do governo estadual e federal.
Pergunta- Essa discussão tem sido pauta na Fundação Cultural?
Sim. Por diversas vezes discutimos, em especial eu e o professor Geraldo que é assessor de planejamento, temos feito e encaminhado propostas neste sentido. Entretanto, ao contrário da produção de eventos, este lado de elaboração de leis, sistematização de projetos e tudo que envolve transversalidade, caminha com mais lentidão. O processo burocrático ainda retarda muito as coisas e não podemos também construir algumas ações sem a participação da sociedade civil.
Infelizmente aprendemos que fazer gestão cultural é cumprir um calendário de eventos, é “ajudar o artista”, isso pode soar como se o artista fosse coitadinho, como se ele não tivesse o potencial de gerar, além de bens culturais, divisas para o município, passando por “alguém que precisa de ajuda”. O artista precisa de um estado que o respeite, não somente como trabalhador, mas em todas as suas dimensões, inclusive na capacidade que ele tem de movimentar economicamente o país.
A economia da cultura está na pauta das grandes discussões internacionais. Pra se ter uma idéia no ano de 2007, segundo o IBGE, a economia criativa movimentou cerca de R$ 97,5 bilhões no Brasil. Esses números indicam que a economia da cultura é um segmento promissor, que o artista precisa ter a garantia de políticas públicas nas quais ele possa estar inserido, não somente recebendo recursos deste estado, mas sentir-se capacitado para o mercado de trabalho e com condições reais de viver da sua produção artística.
Pergunta- Como você avalia então a gestão da Fundação Cultural?
Avalio como positiva, sem dúvidas. Relembro quando estávamos discutindo o nosso primeiro desafio que foi o carnaval de 2009. Tínhamos pouco tempo e uma cobrança dos blocos e da sociedade como um todo, além da nossa própria cobrança em fazermos um carnaval bonito.
Em determinado momento alguém propôs que fizemos o carnaval como vinha sendo feito anteriormente, dado o pouco tempo que tínhamos. Eu defendi que tínhamos que mudar e mostrar a que viemos, senão estaríamos repetindo fórmulas fadadas à comercialização de bebidas e importação de uma cultura que a mídia impunha. Uma frase do Lucena, que não esqueço foi: “se tivermos que cortar na carne para fazermos um carnaval a altura do povo de Imperatriz, nós cortaremos”. Ele falava isso respondendo a inúmeras criticas recebidas de alguns especuladores, acostumados a explorar a festa meramente para ganhar dinheiro. A defesa do presidente era de retomar a festa de rua, da família, dos bailes e das matinês, aonde as pessoas pudessem brincar e beber de uma cultura de paz e de qualidade. Foi quando nós optamos por fazer o desfile dos blocos, com ajuda de custo inclusive, e o resgate das marchinhas, o resultado todos sabem, todos viram.
E posso continuar citando, o Arraial do Povo Festeiro, os concursos de fotografia, redação e artes plásticas, o aniversário da cidade, a Conferência de Cultura, o inter colegial da canção, o cinema nos bairros e outros tantos eventos que tem contribuído, inclusive, para o aumento da auto-estima dos artistas e da população que já percebe a diferença no trato com a cultura, com o artista.
Se com estas ações já podemos perceber a diferença, imagina se dermos conta de avançar e deixar, como herança deste governo, políticas públicas para cultura, que garantam continuidade para que a gente não tenha mais que ouvir que “Imperatriz é cidade do já teve”. Precisamos construir nossas referências em outro parâmetro, naquele que consolide nossa história cultural como nossa maior fortaleza.