ElsonMAraujo
No calendário das nossas vidas, o final de ano é um
tempo marcado por contrastes. Enquanto muitos se entregam ao descanso merecido,
outros mergulham no trabalho redobrado e nas festas típicas do período. É um
tempo em que a esperança se mistura ao cansaço e, para os que têm fé, ao
cuidado invisível dos anjos da guarda. Aprendi cedo, nas aulas de catecismo, a
repetir uma oração que ainda me acompanha:
“Santo Anjo do Senhor, meu zeloso guardador, se a
ti me confiou a piedade divina, sempre me rege, me guarde, me governe, me
ilumine. Amém.”
Mas, nesse frenesi de fim de ano, mesmo os anjos
parecem sobrecarregados. Não por desatenção, mas porque as imprudências humanas
somadas à negligência com o que é público criam um cenário onde o acaso não é
tão acidental assim.
Os jornais estampam histórias que poderiam ser
evitadas, como o desastre de Teófilo Ottoni, em Minas Gerais, ou, mais perto de
nós, o colapso da ponte sobre o Rio Tocantins, ligando Estreito (MA) a
Aguiarnópolis (TO). Essa última tragédia deixou um rastro de dor e indignação.
Uma Tragédia Anunciada
Os moradores já avisavam: a ponte, construída nos
anos 60, apresentava sinais evidentes de deterioração. Nas redes sociais,
vídeos denunciavam fissuras e ferragens expostas, clamando por uma intervenção
que nunca veio. Poucos minutos antes da estrutura desabar, um vereador da
região gravava, incrédulo, o estado deplorável da ponte. E então, como que ao
vivo, testemunhou o que todos temiam: o colapso.
Por milagre – ou esforço dobrado dos tais anjos –
um ônibus com mais de 40 passageiros escapou por um triz de ser tragado pelas
águas. As imagens que circulam mostram rostos tomados pelo alívio, lágrimas de
agradecimento e orações em coro. Ainda assim, a tragédia deixou marcas
profundas, com vidas ceifadas e outras marcadas pela dor.
Culpa de Quem?
Responsabilizar os anjos seria irônico, quase
absurdo. Eles fizeram o que puderam. Mas e nós? E as autoridades que, cegas por
conveniências ou simplesmente pela apatia, ignoraram os alertas? Essa tragédia
não é obra do acaso, mas fruto da negligência. Como bem diz o jargão jurídico,
trata-se de uma tragédia anunciada.
Os culpados têm nomes e cargos. A ponte, mais que
uma estrutura física, era um elo vital entre duas cidades, duas realidades. O
desabamento escancarou não apenas o descaso com a infraestrutura, mas também a
falta de empatia por aqueles que dependem dela para viver.
Lições em Meio ao Luto
No meio da dor, o que fica? Reflexões. A tragédia
da ponte de Estreito nos lembra da fragilidade da vida e da necessidade de
responsabilidade. Não basta ter fé nos anjos ou confiar em forças divinas. É
preciso agir. Exigir que quem tem o poder cumpra o seu papel. Cuidar do que é
de todos como se fosse nosso – porque é.
As famílias enlutadas precisam de amparo, e os
sobreviventes, de coragem para seguir adiante. Que a memória das vítimas não
seja apenas um número em estatísticas frias, mas um alerta para que nunca mais
fechemos os olhos para o óbvio.
Anjos podem não tirar férias, mas nem eles
conseguem proteger-nos de tudo. Cabe a nós sermos zelosos uns com os outros.
Afinal, como nos ensinam as preces da infância, é preciso rezar, mas também
agir.
Que este final de ano seja menos de lamentações e
mais de transformações.