Foto: Dado Galdieri
É triste a
constatação de que com o voto aberto a maioria dos nossos deputados se comporta
dentro do figurino da ética pública, e no escuro da cabine do voto secreto
libera seus mais baixos instintos, votando corporativamente e com interesses
que nada têm de republicanos. Tancredo Neves já dizia que o voto secreto dá uma
vontade enorme de trair.
Isso demonstra que
ainda temos muito o que exercitar na democracia para chegarmos a um Congresso
que realmente represente interesses legítimos da população e de setores da
sociedade, sem manobras nem subterfúgios.
Mas, como a luz do
sol é o melhor detergente, como disse certa vez o juiz da Suprema Corte dos
Estados Unidos Louis Brandeis, com o voto aberto estamos no caminho certo. Só
discordo do voto aberto em situações em que o parlamentar fica sujeito a
pressões, como na nomeação de embaixadores e ministros dos tribunais
superiores, ou vetos presidenciais.
No mais, o voto
aberto deve ser a norma. A regra no Congresso é voto aberto para decisões
legislativas, e a exceção era o veto presidencial, que tinha uma razão.
Historicamente, só na emenda de 1969 é que se instituiu o voto aberto para o
veto, que sempre foi uma garantia da independência da deliberação do
parlamentar face à pressão do Executivo.
Pois nessa reforma
os parlamentares aceitaram manter o voto aberto para os vetos presidenciais,
submetendo-se às pressões do Palácio do Planalto. O voto secreto permanece em
outros casos em que não há deliberação legislativa, como a votação que confirma
a indicação de autoridades: agências reguladoras, nomeações para os tribunais
superiores, embaixadores, procurador-geral da República, que é o titular da
ação penal contra os parlamentares.
Nesses casos se faz
o voto secreto, entre outras razões, para livrar o parlamentar das peias da
própria disciplina partidária. Um partido faz um acordo com governo e enquadra
seus filiados, distorcendo a ação parlamentar. Ou então de pressões externas,
sobretudo do Executivo. São mecanismos cuja finalidade é o equilíbrio entre as instituições,
Executivo, Legislativo e Judiciário.
O fim do voto
secreto no caso de cassação de parlamentar é uma medida correta, embora muitos
apostem que, paradoxalmente, o ex-deputado Marcio Moreira Alves teria sido
cassado se houvesse o voto aberto naquela ocasião, dezembro de 1968.
A decisão da Câmara
pela inviolabilidade do mandato parlamentar resultou na edição do AI-5 no dia
seguinte à votação. Foi o voto secreto que deu coragem à maioria da Câmara para
enfrentar a ditadura. Em tempos de democracia, o voto secreto favorece os
conchavos, os interesses subalternos e corporativos.
Tirar o voto
secreto dos deputados e senadores corresponde a tirar a máscara dos black
blocs. Os parlamentares, à luz do dia, sem poder se esconder no anonimato,
todos condenaram o companheiro Natan Donadon, num resultado diametralmente
oposto ao que aconteceu na primeira vez em que ele foi a julgamento do
plenário, com voto secreto. Naquela ocasião, foi absolvido pelo corporativismo.
Os deputados, protegidos pelo voto secreto, agiram como os black blocs
mascarados, depredaram as instituições.
Na terça-feira, na
votação que pode ter marcado uma nova era para o Congresso, alguns ainda se
abstiveram, mas fazem parte de uma minoria resistente aos novos ares, exceto
naturalmente aqueles com reais motivos para a ausência.
Assim como os
nossos deputados têm agora que mostrar a cara e assumir posições diante da
opinião pública, também seria bom que os black blocs, arrancadas suas máscaras,
fossem para as ruas protestar contra o que quisessem. De peito aberto, cara
limpa, assumindo seus atos. Certamente a violência, e o corporativismo, serão
reduzidos.